Coloco aqui no blog mais uma análise do Ten com a famosa "Alive", motivo de muita discussão entre os fãs na banda com relação à temática de (possível) incesto na sua letra. O texto é do membro Stip, do site The Sky I Scrape, e foi traduzido por mim. Boa leitura!
- Alive –
“Alive” e
“Release” são as músicas mais críticas do álbum por serem justamente aquelas que
oferecem a esperança de redenção, embora nos dois casos seja um esperança
obscura – uma dica de que as coisas podem ser melhores por não conseguirem
piorar mais. Não é coincidência o fato das duas músicas tratarem do mesmo
acontecimento: umas das formas mais intimidantes de traição possível. Enquanto
“Why Go” também é sobre um conflito
entre pais e filhos, ela torna-se mais fácil de entender graças à raiva, há um
rompimento no fato. Em “Alive” não há rompimento, e por isso não há
possibilidade de recomeçar. A necessidade de procurar um novo lugar sempre foi
um tema muito importante nas letras do Eddie (entrar em um carro e dirigir para
longe, subir em uma árvore, procurar por água. Em todos esses casos não há como
haver cura enquanto o sujeito encontra-se perto daquilo que o machuca). Em
“Alive”, tudo aquilo que o cantor achava que era certo para a sua vida era uma
grande mentira, e as pessoas à sua volta envolvidas nessa mentira queriam que
ele seguisse nessa situação como se tudo estivesse bem – as palavras já foram
ditas, bastava agora engolir tudo e seguir em frente, mesmo que dessa forma
tudo continue preso no mesmo espaço ferido e envenenado.
Mas eu estou me distanciando um
pouco do tema. Fazendo o papel de juiz, eu gostaria de dizer que “Alive” é apenas
superficialmente sobre o incesto, e não faz isso da melhor maneira. A música
tem sucesso apesar dessa estória, e não por causa dela. Pessoalmente, eu
acredito que o Eddie escreveu essa história sobre ele e depois acrescentou essa
parte do incesto para criar uma distância entre ele e ela – para torna-la menos
intimidante e reveladora; mesmo que ele tivesse essa estória em mente quando
escrevia ela era apenas secundária.
O riff de abertura de “Once” é
sujo e distraído – é feito para se adequar à loucura presente no cérebro do
vocalista, à inabilidade de se focar em algo. “Alive” é exatamente o oposto.
Ela é pura, clara e provocadora. É a confirmação de um propósito de
solidariedade e força (e é provavelmente o meu riff preferido). A entrega
musical e vocal (essa música é uma das obras primas do Eddie em termos vocais –
em cada verso é entregue a entonação certa – sua confusão, a desconfiança da
sua mãe filtrada através do seu próprio choque e raiva, a força e as
possibilidades que o refrão contém) juntas são os pontos vitais da música; é o
que dá esperança à canção. A letra é sombria e sem vida, e oferece pouco em
termos de salvação; a redenção reside no riff principal. A claridade oferecida
pela melodia e a força contida na voz do Eddie oferecem uma crucial
justaposição na história que está sendo contada. Nós não sabemos se a partir da
história sendo contada o cantor vai sair bem dessa, (na verdade, temos motivos
para acreditar no contrário) mas a melodia e força da voz nos dizem o
contrário.
Eu adoro o jeito casual e
despretensioso que a música começa: “Son, have I got a little story for you”. E
com essa pequena história a mãe destrói a base do universo do cantor – o fato
de isso acontecer exatamente quando ele está no início da sua adolescência é um
agravante, ele está em um momento em que nós construímos a nossa identidade e
que nada na vida é sólido. Nessas alturas, a confiança que ele tinha pela sua
família, sua única segurança, é tirada dele. Ao seguir em frente, mesmo tendo
descoberto que foi adotado, ele sabe também que uma das pessoas que criaram ele
desapareceu para sempre. Mas, enquanto a sua mãe continua contando a história,
problemas acontecem. “Tente não se preocupar”, falando dessa forma a mãe
sente-se aliviada. É como terminar uma conversa com seu filho sobre sexo; é
mais para benefício próprio do que o do filho, algo para poder riscar das lista
de obrigações do pai.
A segunda estrofe é um pouco
problemática uma vez que eu não acredito muito na história de incesto. Eu imagino essa parte como a mãe cruzando o
quarto na direção do filho para confortá-lo, já que ele permanece abalado pela
revelação dela. Isso não é o bastante; algumas palavras de conforto não
conseguem fazer isso sumir. Sim, ele está vivo, a vida continua, mas em algum
sentido tudo parece ser uma grande mentira. Sua vida precisa ser reconstruída e
ele não sabe como fazer isso ou quem procurar para ter respostas (esse alguém
das respostas é especialmente importante considerando a maneira com que o álbum
termina, com o Eddie no escuro, conversando com o seu falecido pai, esperando
por respostas que nunca virão – pelo menos não do seu pai).
E é isso que acontece ao termos
essa insistência no refrão. Tudo é uma mentira, mas pelo menos ele ainda está
vivo. Ele nunca sugere o que fazer
quanto a isso (ele raramente fez isso nos primeiros álbuns – se “Indifference”
fosse escrita hoje ele falaria de fazer a diferença ao invés de deixar isso
para o ouvinte). Ele pode estar vivo, mas não tem nada. Ele pode estar vivo, paralisado, preso e sem
saber para onde ir agora (“Once” aponta para outra possibilidade). Mas fica
claro, tanto pelo instrumental quanto pela força da sua voz, que ele está vivo
e pronto para desafios e que isso será algo que ele sairá por cima. Ele está
vivo, e pronto para começar novamente.
E junto com esse aviso entra o
solo do Mike que, para mim, é um dos solos mais admiráveis e emocionantes de
todos os tempos e indiscutivelmente uma das partes mais poderosas que já ouvi.
Através desse solo, Mike liberta toda a raiva, frustração, trepidação e medo
que o cantor sente, e é através dele que ele acha a força necessária para
continuar. Ele transmite tanto sem ter uma palavra dita, tendo como pano de
fundo a voz do Eddie murmurando (algo que eu gostaria que ele voltasse a
fazer). Ele nos faz lembrar que está vivo, e que vai ficar bem.
“Alive” é uma música
extremamente pessoal e talvez aquela que alguns poucos tem algum tipo de
relação. Mas não é preciso se relacionar de uma maneira direta; “Alive” é para
qualquer um que tenha sido violado (emocionalmente ou fisicamente) por alguém
próximo. Nos faz lembrar que nós podemos e vamos sobreviver ao fato, e que,
desde que estejamos vivos, vamos sobreviver para o amor e a confiança
novamente.
Crédito: Stip, do fórum The Sky I Scrape
Muito interessante a abordagem e a tradução foi muito bem feita. Tenho curiosidade sobre a interpretação da música "Black", a minha preferida entre muitas preferidas.
ResponderExcluirRenato
Obrigado Renato! As análises desse cara são ótimas! Da para fazer um livro de cada álbum se ele quiser! Vou traduzindo aos poucos pois é bastante trabalhoso!
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